sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Aspirina pode diminuir o risco de morte por Câncer

No mundo moderno, o risco de se desenvolver um câncer ao longo da vida é da ordem de 40% e vem aumentando rapidamente. Só na Europa são 3,2 milhões de novos casos todos os anos, com 1,7 milhões de mortes. A previsão do Instituto Nacional do Câncer (INCA) para o Brasil em 2011 são de 500 mil novos casos. Apesar do desenvolvimento de novas drogas para o tratamento, não surgiram nos últimos anos medicações de grande impacto na prevenção do câncer. Em estudos com modelos animais a aspirina se mostrou eficaz em diminuir a incidência de vários tipos de tumores. No entanto, nos estudos com humanos os dados eram conflitantes, parecendo haver relação entre uso de aspirina e menor incidência de adenomas benignos (lesões pré-malignas em intestino), mas sem evidências claras na diminuição da incidência e morte por câncer.

Estudo recente publicado na edição de janeiro da revista médica inglesa The Lancet sugere que o uso diário de aspirina por 5 anos ou mais poderia reduzir o risco de morte por vários tipos de neoplasias. Essa é a conclusão de uma análise de vários estudos que primariamente tinham como objetivo avaliar essa medicação na prevenção de eventos cardiovasculares. Os pesquisadores analisaram de forma agrupada oito estudos randomizados (com um total de 25.570 pacientes) onde os pacientes eram alocados para receber aspirina diariamente ou placebo ou outro antiplaquetário, com duração mínima de quatro anos. Esses pacientes foram acompanhados durante o estudo e após o término dos mesmos por até 20 anos e aqueles que morreram durante o estudo ou follow-up tinham a causa da morte determinada.

Os dados desta publicação mostraram que os pacientes que receberam aspirina diariamente morreram menos por câncer. O beneficio da aspirina começa a aparecer apenas após 5 anos do seu uso e parece ter diminuído as mortes por câncer não apenas de trato gastrointestinal, mas também de outros tumores , como de cérebro, pulmão e próstata. No entanto não teve impacto na redução de outros tumores, como as doenças malignas hematológicas. A redução do risco de morte por câncer nos pacientes que usaram aspirina foi de 33%, sendo uma redução de 54% para os tumores gastrointestinais, com as maiores quedas observadas em esôfago e intestino. Mesmo após 20 anos de seguimento os benefícios da aspirina se mantiveram.

A redução de morte por alguns tumores só foi observada tardiamente, como no caso de tumores de pâncreas após sete anos e tumores de estômago e intestino após dez anos. Os resultados independem do sexo, da raça, se o paciente fumava ou não e da dose de aspirina usada (mínimo de 75 mg/dia). Mas o impacto foi maior nos pacientes com mais de 65 anos e quanto maior o tempo de uso da aspirina. Além disso, os resultados foram semelhantes entre os oito estudos, sugerindo maior consistência dos dados.

No entanto, é preciso considerar algumas limitações e alguns possíveis vieses que podem ter interferindo no resultado. Primeiramente, esses estudos não foram desenhados para determinar o impacto da aspirina na incidência e mortalidade por câncer e sim o seu efeito relacionado a eventos cardiovasculares. Além disso, a maior incidência de anemia e sangramento no grupo da aspirina pode ter levado a uma maior investigação e detecção precoce de câncer. E finalmente, houve uma redução em todas as causas de morte no grupo da aspirina e não somente por neoplasia. Isso significa que novos estudos precisam ser realizados na tentativa de determinar de forma consistente e definitiva o beneficio da aspirina na prevenção do câncer.

Mas esse é o primeiro grande estudo que mostrou haver diminuição na incidência e mortalidade de diversos tipos de neoplasias solidas, não apenas tumores intestinais, em pacientes que fizeram uso de aspirina por no mínimo 5 anos. Além disso, esse beneficio não foi encontrado em nenhum outro agente antiplaquetário, o que coloca a aspirina como uma droga potencialmente efetiva na prevenção de mortes por câncer.

Resenha de artigo publicado no Lancet. 2011 Jan 1;377(9759):31-41.

Por Vinicius Correa da Conceição - médico oncologista do Instituto do Radium de Campinas e do Hospital Vera Cruz de Campinas

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